sábado, abril 23, 2011

Auto de Feira



Há teses lindas. As teses, aliás, são como os contos de fadas. Quanto mais fantásticas e mirabolantes, mais encantadoras e maravilhosas. Um pouco como a indústria de efeitos especiais no cinema. Acontece que não existe isso da "democracia celestial", nem sequer uma democracia minimamente digna da própria teoria, por muito discutível que esta fosse. É escusado pois os anjinhos de coro virem aqui verberar o demónio dos infernos. O que existe, de facto, lamento muito mas não passa disso, são amontoados de esquemas (nem sequer sistemas dignos desse nome), onde o polifeudalismozinho oblíquo enxertado na estupidificação massificada impera, de cima a baixo, numa cascata que só não é cascata porque tudo se processa ao nível do borbulhar e fermentar do pântano. A putre-facção maior arvora-se nata e dita a seu bel-prazer.
O que existe, repito, não é o que se refina e alambica na república dos anjos de Santa Cona do Assobio. Não, cavalheiros e madamas, é aquilo que existe na realidade, processe-se e desfolhe-se esta nos Estados Unidos, na Grã-Bretanha, na Alemanha, na Escandinávia, ou até, pasme-se, por um qualquer milagre de osmose perversa, vulgo imitação saloia de barro das Caldas, em Portugal. E mais: não é ontem, nem anteontem, nem no dia de São Nunca à tarde - é hoje, agora... um agora que, à semelhança do Cronos mitológico, castrou o ontem e cisma de devorar o amanhã. É de Portugal que eu falo, aqui e agora, pois, desculpem lá os pensadores à boleia, é Portugal que me interessa sobremaneira (ainda não consegui alcandorar-me aos requintes sobrexcelsos do Logos Turisticus), é desta espécie retorcida de "democracia siciliana", pois é a que conheço bem. De fio a pavio. Por dentro e por fora. Até que, estupidamente, ajudei a defender no 25 de Novembro de 75, quando grande parte destes democratas encartados e vociferantes da hora presente, ou ainda mal girinavam nas bolsas paternas (ausentes, na época, para parte incerta), ou militavam, com similar algazarra, no lado oposto.
Mas este gentulho pugressista e cienciabundo, esta amálgama de minhocas de esquerda e direita com que se isca o papalvo, que já não acredita em contos de fadas nem mitologias, nem quaisquer outros contos do maravilhoso ou do mistério, acredita ainda, com um frenesim típico dos monomaníacos, em contos do vigário. Uma crendice, aliás, que só é superada pela ciganice grosseira, venal e furiosa com que os traficam e impingem. Não é regime: é negócio. E também não é apenas nódoa nem basta a benzina: é mentira, é crime. E requer prisão.

Sem comentários: