sábado, abril 14, 2012

Coisas de grunhos, digo primatas




Meus amigos, duas perguntas: o que é um campo de batalha? E o que é um campo de futebol? 
Agora a resposta: entre outras coisas menos óbvias e eventualmente mais subtis, um campo de batalha é um sítio onde se podem matar pessoas sem incorrer no risco de ser preso pela polícia. E um campo de futebol, sem nenhuma outra subtileza adicional, é um local onde se pode  injuriar e ofender publicamente  sem experimentar o perigo de ser processado. Poderia até dizer-se que um campo de futebol é apenas um campo de batalha suavizado. Mas, lá está, para compensar de não esfacelar ou chacinar o inimigo, sobrecarrega-se no vitupério e no basqueiro menoscabante. Em vez do troar dos canhões, do silvar da metralha, redobra-se no troar do impropério, no vociferar da bojarda. Resumindo, e dum modo geral, à falta de tomates para matar (e morrer) pela pátria, congregam-se em estádios a urrrar pelo clube. Não há nada de espantoso nisto. E muito menos de sério. Até porque, tanto quanto um sucedâneo, é um regresso nostálgico: à quadripedia. À guturalidade  da infãncia e da caverna pré-histórica. Acresce, só para concluir, que no campo de batalha poderá o combatente, na melhor das hipóteses, alcançar o heroísmo e cobrir-se de glória, enquanto no estádio de futebol o mais elevado que o basbaque ululante atinge é a chimpanzézice formidável  e o auto-soterramento pimpão numa ordinarice pegada.
Pois bem, agora imaginemos um tipo qualquer em plena batalha a desatar num clamor de queixa às autoridades, num chamamento histérico à polícia. Que lhe tentaram acertar com um balázio ou uma granada de morteiro. Que planearam  assassiná-lo com um bombardeamento aéreo. Estão a ver? Não é lá muito plausível, pois não? E, no entanto,  é exactamente a mesma coisa que um tipo qualquer no campo da bola a lamuriar-se que lhe aspergiram das bancadas com um qualquer mimo típido dos símios residentes: "filho da p...", "cabrão do cara,,,", etc, etc. O árbitro, especialmente, no fim de cada jogo, se fosse a dar parte de todas as injúrias e calúnias com que os adeptos da equipa derrotada o brindaram, passava o resto da semana a preencher papéis. Também não acontece por regra e há compreensível tradição nisso.
Todavia, recentemente, surgiu uma moda onde o anedótico vai de braço dado com a bufaria. De repente, tornou-se, mais que aceitável, obrigatório que o tal tipo em pleno jogo rompa a lamuriar-se que lhe chamaram preto, ou, como num caso recente,  que chegaram ao ponto de lhe atirar uma banana (insinuando com isso, presume-se, uma sua qualquer ancestralidade duvidosa). Repito, é equivalente ao sujeito em plena batalha a queixar-se à polícia que o querem matar porque é preto. E é tanto mais ridículo quanto resulta do melindre estapafúrdio dum preto por lhe chamarem preto, ou, mais grave ainda, dum tipo que se enxofra muito porque um bando de chimpanzés o classifica como seu parente afastado.
Até porque se fossem minimamente inteligentes, os alegados agressores (verbais e simbólicos), em vez da banana tinham lançado amendoins... Era mais acintoso e dava menos nas vistas.

PS: Mas, por via das dúvidas, comparem o grunho adepto típico (na fotografia superior) com um honesto orangotango (foto inferior). Concordareis que, bem mais que as vagas semelhanças, sobressai uma diferença evidente e clamorosa: a tímida expressão duma inteligência embrionária na fronha do segundo perante o puro vácuo omnívoro e logofágico na  fuça do primeiro. Daí  ressalta a questão fulcral: como é que alguém consegue sentir-se insultado por um fanático futebolístico? É o mesmo que alguém sentir-se abalroado por uma lesma. Ou atropelado por um micróbio.

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