segunda-feira, agosto 10, 2015

Prelúdio à Anatomia Geopulhítica

«A chamada “democracia” é um logro, o sufrágio universal uma máscara. Nos sistemas modernos burocratizados, cujo nascimento data de meados do século dezanove, a organização feudal foi, digamos assim, transposta para um nível seguinte. O objectivo principal daquilo que Tucídides referiu na sua época comosynomosiai (literalmente, “conjura”), isto é, as confrarias ocultas que agem por detrás dos clãs dirigentes, tem sido transformar o processo de cobrança de rendas à população (um “free income” na forma de alugueres, encargos financeiros e extorsões similares), tão imperscrutável e impenetrável quanto possível. A tremenda sofisticação, e a muralha propagandista de mistificações engenhosamente divulgadas, em redor do sistema bancário - instrumento principal através do qual os hierarcas expropriam e controlam a riqueza das suas comunidades hospedeiras -, constitui o testemunho límpido desta transformação essencial suportada pela organização oligárquica/feudal na era moderna. O Ocidente passou duma estrutura agrária de baixa tecnologia, assente nas costas de servos privados de direitos, para uma colmeia pós-industrial altamente mecanizada que se nutre da força de não menos desprivilegiados escravos de colarinho-branco ou azul, cujas vidas são hipotecadas para comprarem de acordo com as modas do consumo. Os mais recentes Lordes da Mansão já não são mais avistados a exigir o tributo, desde que passaram a confiar nos mecanismos da contabilidade bancária para esse fim, enquanto os sicofantas da classe média, tais como académicos e publicitários, permaneceram inteiramente leais ao synomosiai. A outra diferença concreta entre o antigamente e o agora reside no enorme aumento de rendimentos da produção industrial (cujo nível potencial, não obstante, tem sido sempre significativamente mais elevado que a produção real, de modo a manter os preços altos). No que respeita à “participação democrática” dos vulgares cidadãos, estes sabem lá bem no fundo dos seus corações que nunca decidem nada de importante, e que a política consiste na arte de influenciar as multidões nesta ou naquela direcção, consoante os desejos ou antecipações dos poucos que possuem as chaves da informação, do conhecimento efectivo (secreto) e da finança. Este pequeno número pode, em determinada altura, estar mais ou menos dividido em facções antagónicas; quanto mais profunda a divisão, mais sangrenta a disputa social. O registo eleitoral do Ocidente no século passado constitui um monumento cintilante à completa inconsequência da “democracia”: apesar de duas guerras de proporções cataclísmicas e um sistema último de representação que produziu uma pletora de partidos, a Europa Ocidental não conheceu alteração significativa na sua constituição socio-económica, enquanto a América, com o passar do tempo, foi-se tornando cada vez mais idêntica à sua própria oligarquia, reduzindo o aparato democrático a um concurso entre duas alas rivais duma estrutura monopartidária ideologicamente compacta, que é, de facto, “lobbyzada” por “grémios” mais ou menos ocultos: o grau de participação pública nesta flagrante falsificação é, conforme se sabe, compreensivelmente baixo: um terço dos cidadãos, no melhor dos casos.»
- G.G. Preparata, "Conjuring Hitler - How Britain and America made the Third Reich" (tradução minha)

Nos próximos tempos, e na medida do pouco tempo disponível que me assiste, tentarei investigar um pouco melhor certas mitologias impostas à força de propaganda ultra-pasteurizante. Primeira e Segunda Guerras Mundiais, em concreto.


1 comentário:

Euro2cent disse...

"Too close to the bone", como dizem eles.

Tão certeiro que até dói.