segunda-feira, agosto 01, 2016

Olhai os lírios do campo

«É impossível alcançar através da razão natural o conhecimento da trindade e das pessoas divinas. De facto, temos demonstrado (conferir c.12) que o homem não pode chegar ao conhecimento de Deus pela razão natural a não ser por intermédio das criaturas, e estas conduzem ao conhecimento de Deus como os efeitos permitem remontar-nos às suas causas. A razão só pode, pois conhecer a respeito de Deus o que necessariamente lhe compete - que é o princípio de todos os seres e sobre este fundamento repousa tudo o que sobre Deus temos dito.»
- S.Tomás de Aquino, "Suma teológica" (c.32 a..1)

Mais helenista e menos judaico do que isto não é possível. A natureza é uma linguagem de Deus, só temos que deixar de ser analfabetos no mais importante e sublime de todos os textos: o verdadeiro Biblos é o Cosmos. Oposto (e mais grave: sobreposto) a isto existe algo que, quando não celebra e convive, cobre , distorce  e oculta a linguagem de Deus - aquilo que Aristóteles chamou a Techné, isto é, o Artificial. Ao conjunto do artificial e dos artificialismo, por oposição ao Cosmos, chamamos mundo. O Homem é palco dum combate entre estas duas pulsões antagónicas: o Cósmico que o convoca para Deus e o mundano que o afasta Dele. A alma humana é esse palco. 
O príncipe do mundano não é Deus. Foi isso que Jesus veio mostrar: que esse mundo cospe, injuria e tortura Deus, na pessoa das Suas crias e crianças. E a forma superior como se expressou não foi através de vociferações escalvantes nem totemismos tribais: foi através duma tragédia. A tragédia humana. A nossa.

4 comentários:

Vivendi disse...

A vida humana nunca foi tão artificial como agora.

E a pouco e pouco Deus vai assim se ausentando das cidades para estar cada vez mais presente na natureza onde a vida humana é escassa.

Ah pois é maltinha! Isto de se encontrar Deus não é como andar atrás dos pokemons, tem que lhe se diga.

Laoconte disse...

Luz no meio das trevas.

Anónimo disse...

Não me parece nada que nessa citação do Tomás de Aquino se encontre muito helenismo e pouco judaísmo (ou cristianismo), como afirma o dragão, mas sim uma mistura das duas coisas, o que já seria de esperar, pois o São Tomás é aquele filósofo/teólogo que ficou conhecido por ter cristianizado o aristotelismo.
Tomás começa por dizer que a razão não consegue alcançar ou conceber Deus, quando esta é uma ideia fundamental do judaísmo (que por isso mesmo proíbe qualquer representação do divino), como a afirmaçao/revelação de que Deus é "Aquele que é" mostra, e a que o próprio Tomás recorre para expressar a sua teoria de que a essência de Deus é a sua existência.
Depois, quando ele diz que só se chega ao conhecimento de Deus através dos Seus efeitos está a adoptar a posição gnosiológica de Aristóteles, mas está a subvertê-la para a adaptar ao criacionismo cristão e/ou judaico. Isto porque para Aristóteles Deus é a causa de todo o movimento/devir (e é, por isso, o motor imóvel), mas não é a causa da existência das criaturas ou das substâncias, pois não é nenhum deus criador (e nem sequer conhecedor) da realidade . Para Aristóteles Deus é a causa final do Cosmos, mas não é causa primeira ou criadora deste mesmo Cosmos, como defende Tomás de Aquino e o judaísmo/cristianismo.

marina disse...

"Com efeito, o princípio e o primeiro dos seres é imóvel tanto em si mesmo quanto acidentalmente, mas produz o movimento primeiro eterno e único. E, posto que todo movido é, necessariamente, movido por algo, o primeiro motor é necessariamente imóvel em si, e o movimento eterno tem de ser produzido por algo eterno, e o movimento único por algo uno." ARISTÓTELES

o motor de Aristóteles não será antropomórfico e tal , mas é o princípio e produz o movimento primeiro eterno e único :) na essência : fez-se luz !